Alexander Justi Consultoria e Gestão em BIM

BIM avança no Brasil

Sistema que revoluciona a forma de projetar já está sendo implantado em algumas construtoras; desafio é difundi-lo em todo o mercado
Por Vinicius Prates

clip_image001

O modelo BIM alinha uma série de dados da edificação produzidos em diferentes áreas

A descoberta do DNA representou uma revolução nas ciências biológicas. Os pesquisadores sabiam que nele estava a chave para a compreensão e cura de um sem número de doenças. Mas havia um problema quando foi criado o Projeto Genoma Humano nos anos 80, que já não era saber como funcionava o mecanismo do DNA, mas sim mapear e sequenciar um número gigantesco de dados. O trabalho exigiu anos de trabalho de cientistas de todo o mundo. A partir daqueles conhecimentos todo um novo campo de possibilidades na biologia foi aberto. Na área da construção, uma nova etapa de desenvolvimento, como a que ocorreu com as ciências da vida, pode estar em curso: uma revolução da informação, proporcionada pelo BIM (Building Information Modeling). A comparação só vai parecer exagerada para quem não trabalha com projetos e obras (os engenheiros e arquitetos sabem muito bem como um prédio pode pa­­­­­­­­­recer bem “vivo” muitas ve­­­zes). Se o “ma­­­peamento” de to­­­dos os dados de uma edificação po­­­­­­­­­­­de ser um trabalho desafiador no início, depois de pronto, há enormes vantagens – seja na fase da obra ou ao longo de toda sua história. Enquanto ele existir, haverá informações precisas de cada detalhe que podem ajudar em decisões importantes para os administradores.
“O BIM é muito mais do que uma tecnologia em 3D, e as pessoas ainda confundem isso”, afirma o coordenador de projetos do CTQ (Comitê de Tecnologia e Qualidade) do SindusCon-SP (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo) , Fernando Augusto Correa da Silva, que também é diretor técnico da Sinco Engenharia. Para ele, a palavra-chave para se entender o que significa o BIM é a “interoperabilidade”. Ou seja, a capacidade que o modelo tem de alinhar uma série de dados produzidos por profissionais de diferentes áreas, e que usam ferramentas de informática diversas. Se a possibilidade de modelagens em três dimensões continua sendo a característica mais famosa do sistema BIM, seus usos vão muito além de um efeito simplesmente estético. “São informações que vão ficar para sempre, criando um fluxo de responsabilidades, que pode ajudar até em setores, como o de seguros, ou para pendências jurídicas”, completa Correa da Silva. Quando se produz num sistema convencional, os projetos de arquitetura são posteriormente complementados por planos de hidráulica, elétrica, paisagismo e uma série de outros – inclusive os administrativos, que controlam compras, orçamento, cronogramas, pessoal, e assim por diante. Já com a modelagem em BIM, a ideia é que esses vários programas feitos com objetivos diferentes “conversem” entre si e indiquem soluções integradas automaticamente. Quando um encanamento previsto pelo software usado pelo pessoal da hidráulica está projetado passando “por dentro” de uma viga do desenho de engenharia estrutural, a modelagem aponta automaticamente a incoerência. Ainda mais do que isso: cada desenho pode conter dados que dão indicações sobre materiais, orçamento e cronograma.
“Aquilo que eram operações sequenciais (primeiro projeto, depois levanto os quantitativos, depois orço, depois planejo – com tempos muito longos decorridos entre essas fases) passa a ser praticamente simultâneo, permitindo que as decisões sejam tomadas em função da análise do impacto sobre quantidades, custos, prazos e estratégias de produção, logística e até mesmo manutenção”, explica Maria Angélica Covelo Silva, sócia do NGI (Núcleo de Gestão e Inovação).

Caminho sem volta
Fabio Villas Boas, diretor técnico da Tecnisa, não tem dúvidas sobre o futuro do BIM no Brasil, e dá um recado para aqueles que ainda têm resistência em aprender a operar com um novo sistema: “é irreversível”, afirma. Sob sua coordenação, a Tecnisa está desenvolvendo seu primeiro projeto com o sistema, um empreendimento residencial com quatro torres de médio padrão na cidade de Barueri, município da Região Metropolitana de São Paulo. A escolha desse empreendimento não foi por acaso, já que outras quatro torres estão subindo num terreno vizinho, projetadas de forma tradicional pela mesma empresa. Ou seja, será possível, ao final das obras, fazer uma comparação precisa entre o uso de sistemas diferentes para projetos semelhantes. “É possível fazer uma série de modificações na obra e o BIM vai respondendo a cada etapa – como, por exemplo, inserir uma janela onde antes estava projetada uma parede fechada; a partir daí o sistema já indica que serão necessários menos tantos tijolos, menos argamassa ou tinta, e ao mesmo tempo mais uma janela. Tudo isso vai para o cronograma, o orçamento”, explica Villas Boas. Fernando Correa destaca que a difusão do BIM no Brasil pode significar mais um passo em direção a um novo patamar de qualidade no planejamento e na administração da obra, de maneira que o sistema não pode ser resumido apenas a uma forma nova de fazer o desenho. Para ele, a grande vantagem está na construção de bancos de dados complexos e na facilidade do seu acesso. “Nos últimos 15 anos pelo menos, as empresas todas vêm se adaptando para o ISO e para o PBQP-H [Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade do Habitat], e confirmando seus próprios dados de custos, de planejamento”, diz.

clip_image002

Como o BIM integra projetos de diferentes áreas, ele pode prever, por exemplo, interferências entre os projetos estruturais e de instalações hidráulicas

Com isso, segundo o coordenador do CTQ do SindusCon-SP, foi feito um trabalho de base, fundamental para que o BIM possa operar, já que sem os dados inseridos de maneira precisa, não é possível que o sistema tenha um desempenho adequado. “Foi um longo trabalho para que as construtoras configurassem seus bancos de dados e montassem as planilhas de execução que agora podem alimentar o sistema mais integrado”, completa. O início do projeto é mais trabalhoso, reconhecem os especialistas, já que não dá para deixar detalhes que serão preenchidos depois, com o andamento das obras. “Não é possível com o projeto em 3D do BIM ir fazendo adaptações pelo caminho: o prédio tem que nascer certo”, diz Fabio Villas Boas. No entanto, uma vez superada esta primeira etapa, tudo começa a funcionar com mais sincronia.

Desafios para difusão
Em relação a outros países, principalmente aos Estados Unidos, os projetos em BIM no Brasil ainda ocorrem de maneira incipiente, mas podem ter um impulso adicional com as grandes obras previstas para os projetos esportivos e de infraestrutura dos próximos anos. “Temos um atraso de cerca de 15 anos em relação aos países desenvolvidos quanto a tomar conhecimento, saber o que é, integrar a cadeia produtiva, capacitar profissionais e trabalhar pela implantação”, reconhece Maria Angélica Covelo Silva. Um dos primeiros desafios é capacitar os projetistas para o novo trabalho, e em alguns casos vencer resistências culturais, principalmente daqueles que estão há mais tempo na profissão e que foram obrigados em algum momento da carreira a passar da prancheta para o computador. “A comparação entre o AutoCAD e a modelagem BIM não é entre dirigir um carro menor e um carro maior, mas entre pilotar um avião com manche e outro com joystick”, diz Fabio Villas Boas. Maria Angélica, por outro lado, acredita que a falta de conhecimento é o principal entrave, mais do que uma resistência consciente: “A maioria dos agentes de mercado ainda não sabe o que é isso, não tem visão para enxergar a real abrangência do que esse processo traz para as necessidades do setor”, diz.
Além da capacitação e da organização, é ainda preciso investir em softwares que gerenciam as diferentes etapas da obra e em equipamentos que devem ser mais potentes do que os usados atualmente nos projetos feitos de forma convencional, o que normalmente implica custos que os escritórios menores não estão dispostos a pagar. Além disso, outro problema é apontado pelas empresas: por aqui ainda não existem bibliotecas virtuais para a aquisição de itens prontos que são utilizados nas modelagens. Nos Estados Unidos, onde o sistema já está mais difundido, é possível adquirir todas as especificações de peças sanitárias, ou de componentes elétricos, por exemplo, para aplicações em BIM, enquanto por aqui, é preciso programá-las. Simplesmente copiar do exterior não é uma solução, já que materiais e métodos podem diferir muito, mas montar uma rede de dados brasileira – o que por ora as poucas empresas pioneiras na utilização do sistema estão fazendo de forma individual. Nesse caso, com cada empresa fazendo sua própria programação, não seria difícil prever uma provável dificuldade de padronização para o futuro.

Grupo conhece implantação do BIM nos EUA

clip_image003

O SindusCon-SP organizou no último mês de setembro uma viagem técnica aos Estados Unidos para que um grupo de profissionais da construção civil conhecesse mais de perto algumas aplicações do modelo BIM que estão sendo desenvolvidas naquele país. De acordo com o diretor de relações internacionais do SindusCon-SP, Salvador Benevides, essa é a oitava viagem técnica ao exterior promovida pelo Sindicato, que pretende manter a média de duas por ano. Na viagem, o grupo visitou as cidades de Nova Iorque, onde conheceu dois famosos escritórios de arquitetura, Gensler e SOM, que trabalham com os conceitos do BIM.

clip_image004

Outras etapas de viagem foram a capital Washington e Pittsburgh, onde fica a Escola de Engenharia Civil e de Meio Ambiente da Universidade de Carnegie Mellon, na qual são desenvolvidas pesquisas de aplicação de sistemas informatizados para a construção. O grupo participou de uma apresentação de vários softwares que trabalham com o BIM. Além da informatização, outro interesse da viagem foi conhecer projetos executados com os mais modernos conceitos de sustentabilidade. “Esse tipo de viagem pode trazer boas ideias para o Brasil – o próprio Minha Casa, Minha Vida, que hoje faz tanto sucesso, começou numa experiência no México, que o Sinduscon conheceu há alguns anos”, diz Salvador Benevides.

Fonte: http://revista.construcaomercado.com.br/negocios-incorporacao-construcao/112/artigo190520-1.asp

Compartilhe

Mais Posts

O BIM Mandate pode ter duas interpretações: o documento (Manual do BIM) que detalha aspectos de modelagem ou mandato BIM, que é um padrão que estabelece políticas de implementação da metodologia em certos países. Neste aspecto, o BIM Mandate Brasil é a Estratégia BIM BR, lançada pelo decreto 10.306, de abril de 2020. No decreto, o governo federal estabeleceu a utilização do Building Information Modeling na execução direta ou indireta de obras e serviços de engenharia realizada pelos órgãos e pelas entidades da administração pública federal, no âmbito da Estratégia Nacional de Disseminação do Building Information Modelling- Estratégia BIM BR, instituída pelo Decreto nº 9.983, de 22 de agosto de 2019. Neste post, vamos focar no Manual BIM, que é essencial para os projetos do setor, pois é a definição dos fornecedores ou construtoras sobre as necessidades de informação da estrutura do modelo e vai orientar todo o processo de desenvolvimento do projeto. Leia o post até o final para entender melhor o BIM Mandate, que pode também ajudar as empresas nas contratações de projetos. O que é BIM? Antes de falar de BIM Mandate (Manual BIM), vamos entender o que é BIM (Building Information Modeling). Essa é uma metodologia que envolve um processo inteligente e colaborativo, baseado em um modelo 3D único para a indústria da Arquitetura, Engenharia e Construção. Como o modelo é único, o processo é totalmente colaborativo entre as disciplinas permitindo projetar, analisar, planejar, gerenciar e operar sistemas de construção de uma forma muito mais rápida e segura do que os métodos tradicionais. Além disso, o BIM também possibilita redução de custos e de tempo de execução de obra, permitindo agregar muito mais valor aos projetos do setor construtivo. No mundo, a necessidade da metodologia vem crescendo de tal forma que, além das edificações, também tem sido utilizado o BIM na modelagem das cidades. Para que serve BIM Mandate? Vamos ao BIM Mandate ou Manual BIM: é um documento essencial porque vai orientar as equipes tanto na identificação quanto na execução de cada fase do ciclo de vida do projeto. Normalmente, é utilizado por uma construtora, empresa de projetos ou setor do órgão público com suas regras gerais de trabalho em BIM. Por meio deste documento, criado antes de iniciar o projeto, todos os padrões de construção são definidos e especificados pelos fornecedores (escritórios de arquitetura ou engenharia) ou empreiteiras. São formas únicas de realizar o procedimento para modelagem. Funciona como um manual pré-definido, sendo Open BIM para trabalhar com a interoperabilidade, que se dá por um ambiente colaborativo por meio de IFC (Industry Foundation Classes), que é um formato que permite o intercâmbio de informções. Também pode ser com BIM exclusivo (especialmente para a iniciativa privada) quando é utilizado somente determinados softwares nativos da mesma plataforma, como o Archicad ou Revit. Confusão entre BEP e BIM Mandate Há também uma certa confusão no mercado quando associam o BIM Mandate como BEP (Plano de Execução BIM). Enquanto o Manual BIM vai apresentar as regras gerais pré-definidas do trabalho com base no BIM, o BEP é criado a cada projeto, como foco em um produto específico, de contrato a contrato, para definir plano de implementação do BIM para aquele projeto, usos, processos, coleta de informações, responsabilidades e funções, softwares, cronograma, documentos, etc. BIM Mandate: exemplo do que deve constar Quando um escritório de arquitetura ou engenharia tem o seu próprio BIM Mandate pode agregar valor ao trabalho que vai oferecer aos seus clientes, porque demonstra que essas diretrizes podem promover um potencial de eficácia aos resultados do projeto. O processo de levantar informações sobre gargalos, custos e estimativas de melhorias por si só já agrega valor aos trabalhos das empresas que têm um BIM Mandate porque pode demonstrar que está compatível com as exigências e especificidades do mercado construtivo. Neste BIM Mandate estarão destacados detalhes das variadas etapas dentro do ciclo de vida do projeto BIM. Veja as informações que deverão constar no documento e serão disponibilizadas à equipe: Definição dos usos do modelo BIM e diretrizes de Modelagem; Definições de Projeto; Padronização de nomenclaturas de: materiais, bibliotecas, arquivos, etc; LOD (Nível de Desenvolvimento do modelo em cada etapa de entrega); LOI (Nível de Informação); Planejamento (BIM 4D); Orçamentação (BIM 5D); Coordenação de Projetos; Diretrizes de interoperabilidade; Entregáveis BIM; Utilização vinculada à EAP. Conclusão O BIM Mandate é recomendado para a fase anterior ao início do projeto porque certamente servirá para garantir muito mais estrutura aos dados e processos necessários. Dessa forma, tanto o planejamento quanto desenvolvimento do projeto tendem a ser muito mais organizados e eficientes. Vale a pena produzir o documento.

BIM Mandate: entenda o que é

O BIM Mandate pode ter duas interpretações: o documento (Manual do BIM) que detalha aspectos de modelagem ou mandato BIM, que é um padrão que